terça-feira, 21 de agosto de 2012

Em 1989: reportagem sobre a morte e o velório de Raul Seixas

Do papel # 14

Hoje, dia 21 de agosto de 2012, 23 anos após a morte de Raul Seixas, compartilhamos uma matéria publicada em 1989, repercutindo a tristeza dos fãs na despedida do Maluco Beleza.

Antes de tudo, a reportagem — da Revista Contigo!, assinada por Gláucia Padilha — será compartilhada pelo caráter histórico, por registrar um pouco do que se falava de Raul Seixas e sua morte à época dos acontecimentos. Para os que conhecem um pouco mais da vida e da obra de Raul Seixas, será fácil perceber no texto alguns deslizes, passando informações improcedentes.

Alguns erros do texto estão com uma observação nossa entre colchetes. Clique nas imagens para ampliar as páginas da revista.
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Morte de Raul Seixas leva fãs à loucura!
por Gláucia Padilha - Revista Contigo! (1989)

Há muito não se via uma manifestação popular igual. Desesperados, os fãs de Raulzito mostraram toda a dor no velório
Contorcidos de dor e desespero, milhares de fãs do "maluco" Raul Seixas prestaram sua última homenagem ao rei do rock brasileiro. Cantando os grandes sucessos do ídolo, uma multidão completamente transtornada beirou as raias da loucura. Lágrimas, desmaios e gestos tresloucados: houve invasão do necrotério de Vila Alpina (em São Paulo) e até tentativa de impedir que o corpo fosse sepultado em Salvador.

A tragédia se abateu sobre os fãs quando as rádios começaram a noticiar que Raul havia deixado de criar às 5 da madrugada de segunda-feira por causa de uma parada cardíaca. Sem acreditar na história, uma legião de jovens tomou as dependências do Hotel Aliança — onde Raul vivia há dois anos — na esperança de encontrar Raulzito com vida e, como sempre, rindo da situação.

Infelizmente o sonho dos fãs não se concretizou. Seu corpo jazia numa das câmaras mortuárias do Crematório de Vila Alpina. Quando a informação se espalhou, outra multidão se aglomerou na frente do crematório e, num momento de desespero, invadiu o necrotério. Mas o caixão do ídolo já tinha partido para o Palácio das Convenções do Anhembi, onde encontrou milhares de "seguidores" do autor de "Metamorfose Ambulante".

A noite foi longa e triste. Mas ninguém arredou pé um instante do local onde descansava o baiano que ousou e revolucionou o rock. Muitos — vestidos com camisetas de fãs-clubes do cantor — sacaram o violão e entoaram as músicas de Raul. Essa multidão acompanhou o carro do Corpo de Bombeiros que levou o caixão ao aeroporto para embarcá-lo num jatinho em direção a Salvador. Na Bahia, as manifestações se repetiram com a mesma intensidade. Só pararam quando os funcionários do Cemitério Jardim da Saudade despejaram a última pá de terra sobre o caixão.

Inquieto e sempre antenado em tudo, Raulzito não precisou viver mais que 12 anos para negar a educação conversadora recebida dos pais, Raul Varela Seixas e Maria Eugênia. Se jogou de cabeça no louco e maravilhoso mundo do rock assim que ouviu pela primeira vez Chuck Berry, Little Richard, Elvis Presley e Bill Haley. Ídolos que cultuou até o fim.

— Tinha um vizinho que trabalhava no consulado americano e me emprestava todos os LPs desse povo — lembrava sempre. — Fui ficando tão alunicado pelo som deles que resolvi criar meu próprio grupo.

Assim, em 1957, nascia Os Panteras, classificado pelo artista como um conjunto de rock genuinamente baiano [na realidade, o primeiro grupo de rock de Raul foi fundado em 1962, batizado como Relâmpagos do Rock, que no ano seguinte virou The Panthers e depois Raulzito e Os Panteras]. Só que a primeira investida de Raul Seixas na carreira musical não foi o que se poderia definir como sucesso. Mas, persistente, o roqueiro demorou bastante para se desiludir com os Panteras: doze anos! Somente quando mudou com a primeira das cinco mulheres para o Rio de Janeiro é que sacou que embarcara numa canoa furada.

— No Rio, gravamos um compacto e um LP que não deram em nada — contava. — Então dissolvemos o grupo.

Mas no VII Festival Internacional da Canção (FIC), da Globo, em 1972, o Brasil conheceu o Raul Seixas definitivo. Magro, alto, com roupa de couro pretas, óculos escuros e barba por fazer, simplesmente arrasou em "Let Me Sing, Let Me Sing", rebolando à la Elvis Presley. Mas esse foi apenas o começo. Mesmo porque só depois de "Ouro de Tolo" e "Al Capone" (feitas em parceria com o jornalista e poeta Paulo Coelho) [correção: "Ouro de Tolo" é apenas de Raul Seixas] é que ele arrebatou os milhares de seguidores que, não contentes em ser apenas fãs, cumpriam à risca todos os seus postulados.

— As pessoas me tomavam como um guru — dizia Raul, assustado. — Já teve gente que só apareceu em meus shows para levar os filhos doentes, pensando que eu poderia curá-los.

Tal carisma, entretanto, criou muitos problemas para o polêmico roqueiro. Depois do sucesso de "Gita" (1973) [na verdade, Gita é de 1974], o portador da carteirinha n.9 do Elvis Presley Rock Club de Salvador passou a "pregar" uma "Sociedade Alternativa". Foi o suficiente para a ditadura militar considerá-lo "a mosca que pousou na sopa" dos generais.

— Fui preso e torturado para denunciar a tal sociedade — relembrava. — Depois me "convidaram" a deixar o país.

Raul foi parar nos Estados Unidos, onde conheceu John Lennon, que o convidou para ingressar na fechadíssima seita Astrum Argentum (anti-sistema) [essa história do encontro entre Raul Seixas e John Lennon nunca foi confirmada por ninguém além do próprio Maluco Beleza. E pelo que se sabe, foi um dos mirabolantes contos que o autodenominado "bom ator" Raulzito inventou para brincar um pouco...]. Com a cabeça feita, retornou ao Brasil querendo ser um maluco. Aliás, na mesma época, lançou Maluco Beleza. E passou a ser o alvo predileto da Censura. Nunca mais deixou de ter problemas com aqueles que classificava de "castradores da arte".

Neste período, também, o corpo do roqueiro passou a registrar os primeiros reflexos dos abusos que cometia. Sorvedor compulsivo de uísque e consumidor assumido de drogas, Raulzito foi obrigado a baixar ao hospital no início da década de 80, para retirar metade de seu pâncreas.

O susto fez o artista jurar que acabaria com os excessos. Mas, na verdade, ele preferia ser "uma metamorfose ambulante do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo". Talvez por isso tenha continuado a fazer de tudo. Principalmente o que os médicos lhe proibiam.

Depressões e crises de pancreatite se sucederam. Alternava períodos internado em clínicas de desintoxicação com fases de lucidez e produção artística. De uma irregularidade constante, sumia e reaparecia, deixando o público sem entender absolutamente nada.

— Não sou obrigado a dar continuidade a qualquer trabalho — explicava. — Não sou Gil ou Caetano. Sou louco, mas coloco todo ano um disco nas paradas.

Desaparecido por quase quatro anos do showbizz, eis que o demolidor solitário se junta a Marcelo Nova (ex-Camisa de Vênus), com o argumento de que o Nova era o único roqueiro que respeitava, pois os outros, "de Rita Lee ao 'Paralamas do Fracasso', todos são um engodo". Fez 50 shows neste ano e gravou o LP A Panela do Diabo, que chegou às lojas no dia seguinte a sua morte com a premonitória música "Canto Para a Minha Morte" [aqui um erro crasso: "Canto para minha morte" abre o disco Há 10 mil anos atrás, gravado em 1976: 14 anos antes da morte do compositor]. "A morte, surda, caminha ao meu lado", dizem seus versos. "E eu não sei em que esquina ela vai me beijar, com que gosto virá? Será que ela vai deixar eu acabar o que tenho de fazer? Ou será que ela me pegará no meio de um copo de uísque...?"
Gláucia Padilha
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Reportagem feita no Raul Rock Seixas (presidido por Sylvio Passos) um dia antes da morte do cantor. E na sequência do vídeo, o reencontro dos fãs no velório do artista.

Um comentário:

  1. o roch nacional foi seputado junto com o raul. a vida nao tem mas graça sem o nosso maluco beleza.

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