sábado, 16 de abril de 2016

Afete-se! Sobre o novo ‘O Pequeno Príncipe’



por Josú Ribeiro

Não sou esse fã de animações assíduo. Não acompanho qual a animação foi considerada a melhor do ano, essas coisas. Elas geralmente aparecem em minha vida de forma singela, tímida, entretanto me fazem um belo estrago. Eis a última animação com a qual me deparei: O Pequeno Príncipe, do diretor Mark Osborne. Uma adaptação do livro do escritor Antoine de Saint-Exupéry. Movido emocionalmente a assistir mais uma versão cinematográfica de um clássico da literatura infanto-juvenil francesa, me permiti experienciar o filme da maneira fluida, de forma natural.

Para quem ainda não teve a oportunidade de ler o livro do Pequeno Príncipe, a história se passa com um aviador, que numa de suas viagens pelo mundo acaba por sofrer um acidente no deserto do Saara, no qual consegue sobreviver. Neste local, lhe aparece um menino loiro lhe pedindo para desenhar um carneiro. E toda a história a partir daí se desenrola. O livro fala, entre outras coisas, sobre o processo que percorremos para nos tornamos adultos.

O filme é montado através de 3 histórias que acabam por se conectarem. A primeira é a de uma garota que tem a vida regrada pela mãe, com um objetivo maior: de conseguir vaga numa escola renomada que a mãe tanto sonhava. Já a segunda é a história clássica do Pequeno Príncipe, mas reduzida, e com suas frases de efeito já tão compartilhadas mundo afora. A terceira história é uma surpresa para quem ainda não assistiu.

Apesar de achar interessante a construção, não me agradou a primeira história. Tive a impressão de que ela servia como veículo entre a segunda e a terceira, com detalhes que tinham a pretensão de ser engraçados e com pobreza de conteúdo. Claro, o foco era o Pequeno Príncipe. A segunda, esta incrivelmente montada com uma técnica praticamente artesanal, que é a stop-motion, montado sequência por sequência, com uma fotografia imensamente bela. A terceira é o catalisador da segunda história, mas com reinvenções.

Diversos insights me vieram ao ver a última parte do filme, ao conectar com outras cenas, e que me fizeram ficar emocionado. É incrível como aos poucos vamos perdendo nossa criatividade e autenticidade em nossa vida. Buscamos ser os melhores em tudo, conseguir as melhores notas, salários, em busca de um capital maior, de mais recompensa de uma vida séria, uma vida adulta. Seria como se nos entregássemos uma estrela, e que nos é dada a premissa: - «Pinte esta estrela». No mundo adulto, pinta-se de uma só posição, de uma só cor, ou com a cor da moda, e com o maior cuidado possível, sem sair dos traços do desenho. Mas por que não ousarmos pintar da forma que nos convém? Por que não pintá-la de várias posições ou pintar fora do desenho, construindo novas estrelas, e que acrescentássemos histórias que contassem a vida de outras estrelas e assim por diante. Em algumas cenas, que davam uma espetada em nossa atual forma de ensino, me deparei escutando a música “Another brick in the wall”, do Pink Floyd. O processo que nos transita da infância para a adultez, nos tornando pessoas sérias e responsáveis acabou por nos endurecer, tornando o nosso planeta “B1Vida” cheia de daninhas, que cresceram e que quase destroem a nossa forma de cativar e ser cativado, e que isso implica choros, que implica quedas, que implica crescimento, este que somente cada um de nós pode sentir.

Não venho a falar aqui que sejamos um eterno Peter Pan, sem responsabilidades perante ao mundo etc. Mas sim que atentemos para nossas formas de sermos afetados pelas outras pessoas. Ao nosso endurecimento emocional perante aos fatos desnorteantes que há na vida, e que nos é dada pela vida adulta a invisibilidade emocional, sendo extremamente danosa para nossa sobrevivência comunitária. Saí com um grande aperto no peito depois do filme. Mas um aperto que me fez relembrar como é ficar bastante afetado às 14 horas, se a outra pessoa só vem às 14h20. 
____


Josú Ribeiro é poeta e músico. Atualmente estuda Psicologia na UniLeão.

Texto originalmente publicado na SÉTIMA: Revista de Cinema (edição 25, de outubro de 2015), que é distribuída gratuitamente na Região do Cariri cearense. A Revista Sétima é uma publicação do Grupo de Estudos Sétima de Cinema, que se reúne semanalmente no SESC de Juazeiro do Norte-CE.

.

Nenhum comentário:

Postar um comentário